Foi aprovada pelo Tribunal de Contas da União (“TCU”), em 21 de fevereiro de 2024, a Instrução Normativa nº 95/2024 (“IN nº 95/2024”), que define as diretrizes, regras e ações do TCU em matéria de celebração e negociação de acordos de leniência previstos na Lei nº 12.846/2013 (“Lei Anticorrupção”). A medida é decorrente do conjunto de esforços do Acordo de Cooperação Técnica (“ACT”) firmado em agosto de 2020 entre a Advocacia-Geral da União (“AGU”), a Controladoria-Geral da União (“CGU”) e o Ministério da Justiça e Segurança Pública (“MJSP”), sob a coordenação do Supremo Tribunal Federal (“STF”).

A IN nº 95/2024 prevê que, uma vez que a proposta do acordo de leniência seja encaminhada ao TCU, serão iniciadas as etapas internas e sigilosas de identificação dos processos de controle externo e levantamento de débitos previamente calculados em relação à proponente, com o encaminhamento das informações ao ministro relator responsável pelo caso. Não obstante, caso a CGU encontre e direcione novas informações ou documentação com força de alterar o escopo da proposta do acordo de leniência, estas etapas de identificação elencadas deverão ser refeitas. Cumpre ressaltar que, caso as informações fornecidas pela proponente às autoridades não sejam verdadeiras ou completas, e isto implicar a alteração das condições do acordo, a revisão do seu conteúdo poderá ser realizada a qualquer tempo.

Além disso, as diretrizes da nova Instrução Normativa estabelecem prazos para manifestação do TCU. Segundo o art. 6º da IN, após a comunicação da CGU e da AGU de que o acordo está pronto para ser assinado, a área técnica do TCU terá o prazo de 45 dias, dentro dos 90 dias designados para a manifestação do TCU, para tratar sobre os valores negociados e decidir se tais valores atendem aos critérios aplicáveis e se são suficientes para o ressarcimento ao erário, de modo a garantir que o acordo será benéfico à Administração Pública.

Nesse sentido, caso o TCU entenda que os valores não sejam adequados, caberá ao TCU comunicar a CGU e a AGU acerca da necessidade de complementação para ajuste dos valores negociados, bem como informar o montante adequado para possibilitar o ressarcimento aos cofres públicos. Por outro lado, caso o TCU entenda pela procedência dos valores, será dever do TCU acompanhar os pagamentos até o momento em que as obrigações assumidas pela empresa signatária sejam satisfeitas, estando a aplicação de medida sancionadora pelo TCU impossibilitada no caso de a signatária do acordo de leniência cumprir com suas obrigações.

Não obstante, em relação aos casos em que as quantias estipuladas no âmbito do acordo de leniência abarcarem os danos identificados previamente pelo TCU, os processos que envolvem a empresa e que sejam relacionados às mesmas ilicitudes tratadas no âmbito do acordo poderão ser passíveis de (i) sobrestamento; (ii) arquivamento; (iii) vinculação a procedimentos de mero monitoramento do adimplemento do acordo de leniência; e (iv) não instauração de ação de controle externo ainda não existente quanto às irregularidades que estão no escopo do acordo.

É válido pontuar que, em face da inadimplência da empresa signatária do acordo, é permitido ao TCU suspender os benefícios do acordo, mediante oitiva dos órgãos públicos e da empresa signatária, além de declarar potencial nulidade dos efeitos do acordo. Nesse cenário, segundo o art. 27 da IN nº 95/2024, caberá ao processo de controle externo já existente, ou a um novo que seja instaurado, analisar a adoção de sanções e/ou cobrança das quantias inadimplidas.

A IN nº 95/2024 também se preocupou em adequar sua redação às disposições da Lei nº 13.709/2018 (Lei Geral de Proteção de Dados) no que diz respeito ao compartilhamento de dados e informações durante o trâmite interno no TCU. De acordo com o art. 11 d a IN nº 95/2024, resta estabelecido que em face de eventual não celebração do acordo de leniência, todos os documentos fornecidos pela proponente deverão ser deletados das bases de dados do TCU. Adicionalmente, as informações que são compartilhadas entre a CGU e a AGU não poderão ser utilizadas em desfavor da proponente pelo TCU, ainda que o acordo não venha a ser celebrado futuramente. Em relação à responsabilização de terceiros que estejam envolvidos nas condutas admitidas pela empresa signatária do acordo de leniência, o art. 24 da IN nº 95/2024 determina que o TCU poderá utilizar documentos e informações a que teve acesso para promover, no âmbito de suas competências, as ações necessárias à responsabilização destes terceiros, sejam eles pessoas físicas ou jurídicas.

Em linha com decisões já proferidas pelo STF em anos anteriores e em consonância com a necessidade de melhor cooperação dos entes que compõem o microssistema anticorrupção brasileiro, a IN nº 95/2024 traz previsões em que há a possibilidade de abatimento ou compensação de multas já pagas por condutas tipificadas em diferentes legislações, desde que comprovado pela empresa que as irregularidades sancionadas são exatamente as mesmas abarcadas em processo instaurado pelo TCU.

Assim, a IN nº 95/2024 se torna um instrumento que busca trazer maior segurança jurídica no âmbito dos acordos de leniência ao garantir um cenário de maior previsibilidade às empresas que consideram aderir a esta modalidade de resolução de irregularidades. Levando em consideração os múltiplos agentes que estão envolvidos na dinâmica desses acordos, a pluralidade de informações compartilhadas nas investigações e a falta de diretrizes que regulem a atuação do TCU na negociação, celebração e apuração dos valores de acordos de leniência que persistia, a IN nº 95/2024 será responsável em estabelecer primordial disciplina normativa às competências e âmbitos de atuação do TCU nesse contexto.

Para mais informações, entre em contato conosco.

em inglês