Em 18 de julho de 2022, entrou em vigor o Decreto nº 11.129/2022, revogando o Decreto nº 8.420/2015 e conferindo uma nova regulamentação à Lei nº 12.846/2013, conhecida como Lei Anticorrupção (LAC). De modo geral, o novo decreto federal revoga o Decreto 8.420 de 18 de março de 2015, que regulava a matéria até então, resguardados os atos praticados antes de sua vigência, e tem aplicação imediata aos processos em curso, além de incorporar disposições já previstas em ato normativos e entendimentos internos da Controladoria-Geral da União (CGU) e da Advocacia-Geral da União (AGU).

Neste contexto, os programas de integridade, foram regulamentados nos artigos 56 e 57, recebendo especial ênfase da nova legislação. Os novos dispositivos alteram relevantes parâmetros para avaliação dos programas de integridade, os quais são levados em consideração na aplicação de sanções impostas pela LAC, na forma do artigo 7º, inciso VIII da Lei 12.846/2013.

Um aspecto relevante foi o aumento dos benefícios para que as pessoas jurídicas adotem um programa de integridade efetivo, capaz não apenas de detectar e sanar, mas igualmente de prevenir desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos praticados contra a administração pública, nacional ou estrangeira. Dentre esses benefícios, destaca-se o aumento de 4% para 5% do percentual máximo de redução da multa passível de ser concedido, caso a pessoa jurídica demonstre possuir um programa de integridade anterior à prática do ato lesivo.

O Decreto nº 11.129/2022 também enfatizou, em seu artigo 56, inciso II, que os programas de compliance devem ser utilizados como meio de fomentar e manter a cultura de integridade no ambiente organizacional. Nesse sentido, vale destacar que o artigo 57, inciso IV, reforça a importância da comunicação e do treinamento sobre o programa de integridade, ferramentas fundamentais para a disseminação da cultura organizacional nas empresas.

Ademais, a nova regulamentação da LAC, conforme disposto no artigo 57, reforçou os critérios para análise da efetividade dos Programas de Integridade, tornando-os mais rigorosos e robustos. Dentre os parâmetros de avaliação da efetividade do programa de integridade, foram incluídos os seguintes critérios capazes de reduzir as sanções aplicadas às pessoas jurídicas que adotarem eficientes programas de integridade:  (i) a destinação de recursos adequados como evidência do comprometimento da alta direção da pessoa jurídica; (ii) ações de comunicação periódicas sobre o programa de integridade; (iii) gestão adequada de riscos, incluindo análise e reavaliação periódica para realização de adaptações necessárias ao programa de integridade e a alocação eficiente de recursos; (iv) mecanismos destinados ao  tratamento de denúncias; e (v) diligências apropriadas (“due diligence”), baseadas em risco, para contratação e supervisão de despachantes, consultores, representantes comerciais, entre outros terceiros, bem como de pessoas expostas politicamente (PEP) e seus familiares, estreitos colaboradores e pessoas jurídicas de que participem, e para realização e supervisão de patrocínios e doações. Cabe ressaltar que esses parâmetros variam de acordo com o quantitativo de funcionários, empregados e colaboradores, o faturamento, a estrutura de governança corporativa e a complexidade de unidades internas ou da estruturação do grupo econômico.

Sobre a destinação de recursos adequados como evidência do comprometimento da alta direção da pessoa jurídica, esse parâmetro visa reforçar a importância da participação da alta administração no programa de integridade, não apenas prestando suporte visível e inequívoco ao programa (“tone from the top”), mas demonstrando esse comprometimento através da alocação de recursos financeiros, tecnológicos e humanos que viabilizem a implementação de um programa de integridade efetivo. Assim, o novo Decreto cobra uma coerência entre o volume de recursos alocados na implementação do programa de integridade e o que é efetivamente executado na mitigação de riscos de atos potencialmente lesivos. Ademais, reforça o conceito que não basta o compromisso formal, sendo necessário também o compromisso material para construir uma cultura de integridade, verdadeiro pilar de um programa de integridade efetivo.

Com relação ao mecanismo destinado ao tratamento de denúncias, o novo Decreto dispõe que, além do canal de denúncias, devem ser estabelecidos mecanismos destinados ao tratamento efetivo das denúncias recebidas. Deste modo, o Decreto corrobora com a visão de que não basta a disponibilização de um e-mail ou um canal 0800 para registrar as reclamações, sendo necessário avançar na implementação de uma política de comunicação de irregularidades para regular o trâmite das reclamações recebidas, em consonância com o que vem sendo exigido no cenário internacional, a exemplo da Loi Sapin II na França. Isso tende a  provocar um aumento no número de investigações internas de compliance  nas empresas, e o que se espera é que estas sejam cada vez mais proativa e eficientes  na apuração e punição das irregularidades.

Ademais, o  Decreto nº 11.129/2022 prevê que a Controladoria-Geral da União deverá editar orientações, normas e procedimentos complementares sobre a avaliação do programa de integridade, inclusive sobre a forma de avaliação simplificada no caso de microempresas e empresas de pequeno porte.

Por fim, observa-se que o novo decreto federal manteve outros parâmetros mínimos de avaliação dos programas de integridade que já eram adotados com base no decreto anterior não trazendo mudanças profundas neste ponto. Nesse sentido, vale citar como exemplos a adoção de (i) padrões de conduta, código de ética, políticas e procedimentos de integridade, aplicáveis a todos os empregados e administradores, independentemente do cargo ou da função exercida, além de estendidas, quando necessário, a terceiros, tais como fornecedores, prestadores de serviço, agentes intermediários e associados; (ii) registros contábeis que reflitam de forma completa e precisa as transações da pessoa jurídica; (iii) controles internos que assegurem a pronta elaboração e a confiabilidade de relatórios e demonstrações financeiras da pessoa jurídica; entre outros.

No entanto, as alterações introduzidas pelo Decreto nº 11.129/2022 reforçam o papel fundamental dos programas internos de compliance enquanto instrumentos de governança indispensáveis à garantia da higidez do relacionamento público-privado, confirmando a tendência de que os programas de compliance nas empresas devem avançar cada vez mais da formalidade para a efetividade.

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