Desde sua promulgação em 2018 e considerando que, desde 1º de agosto de 2021, as empresas devem obrigatoriamente aplicar e estar em conformidade com as disposições da Lei nº 13.709/2018, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), para evitar sanções as empresas vêm enfrentando o desafio de se adaptar aos padrões exigidos pela LGPD, inclusive considerando os custos da implementação de um programa de proteção de dados.
Nessa esteira, em 08 de julho de 2021, a Justiça Federal de Campo Grande proferiu uma sentença determinando que as despesas com a implementação das diretrizes da LGPD comprovadas pelas impetrantes, TNG Comercio de Roupas Ltda. e TB Indústria e Comércio de Confecção de Roupas Ltda., fossem consideradas como insumos, além de reconhecer o direito das impetrantes de realizar a compensação dos valores pagos a maior com os débitos de sua responsabilidade, após o trânsito em julgado da sentença.
A justificativa da decisão para que os custos com a implementação das diretrizes da LGPD fossem reconhecidos como insumos para fins de compensação de créditos para o PIS/COFINS foi baseada nos Artigo 3º, II, da Lei nº 10.637/2002 e o Artigo 3º, II da Lei nº 10.833/2003, que determinam que do valor apurado para a contribuição para o COFINS e PIS, respectivamente, poderão ser descontados créditos pela pessoa jurídica em relação a:
“II – bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes, exceto em relação ao pagamento de que trata o art. 2º da Lei nº 10.485, de 3 de julho de 2002, devido pelo fabricante ou importador, ao concessionário, pela intermediação ou entrega dos veículos classificados nas posições 87.03 e 87.04 da TIPI; (…)”
Não obstante nenhuma das duas leis mencionadas acima definir o que pode ser considerado como insumo para aproveitamento no sistema da não-cumulatividade de PIS e COFINS, considerou-se o entendimento da jurisprudência para entender a definição de insumos. O STJ, no REsp Repetitivo nº 1.221.170/PR (Temas 779 e 780), firmou que o conceito de insumo deve ser verificado de acordo com os critérios de essencialidade ou relevância. Ou seja, deve ser considerada a imprescindibilidade e importância do bem ou serviço para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pela empresa.
No julgado do STJ, o termo essencialidade foi definido como “o item do qual dependa, intrínseca e fundamentalmente, o produto ou o serviço, constituindo elemento estrutural e inseparável do processo produtivo ou da execução do serviço, ou, quando menos, a sua falta lhes prive de qualidade, quantidade e/ou suficiência” e a relevância seria “qualidade identificável no item cuja finalidade, embora não indispensável à elaboração do próprio produto ou à prestação do serviço, integre o processo de produção, seja pelas singularidades de cada cadeia produtiva”.
Dessa forma, com a admissão desse conceito de insumo, a Justiça Federal de Campo Grande reconheceu, que o investimento em proteção de dados é obrigatório, considerando inclusive que há aplicação de sanções a quem infringir a norma. O Juízo entendeu que o tratamento dos dados pessoais não fica a critério do empresário e que, portanto, os custos são necessários e imprescindíveis para o alcance dos objetivos comerciais.
Os investimentos para adequação são muitos, considerando, por exemplo, a implementação de sistemas e processos para identificação de falhas, criação de canal de comunicação com o titular dos dados, realização de treinamentos internos sobre o tema, contratação de funcionários especializados em proteção de dados, incluindo um Data Protection Officer, entre outros. Todos esses custos são essenciais para evitar potenciais danos aos titulares, como vazamento de dados, e total conformidade com a legislação.
Destaca-se que, ainda que exista a referida jurisprudência, é necessário que empresas ingressem em juízo para reconhecimento do direito ao crédito de insumos para PIS e COFINS. Atualmente, a Receita Federal aplica de forma limitada o conceito de insumo e cabe a empresa interessada comprovar judicialmente a essencialidade e relevância dos gastos.
Em síntese, ainda que essa seja a primeira decisão admitindo a possibilidade de compensação de crédito envolvendo gastos com LGPD, representa um importante precedente, visto que reconhece os investimentos com a implementação das diretrizes da LGPD como obrigatórios, o que pode beneficiar todas aquelas empresas que tiveram despesas para implementação e manutenção de estruturas para adequação à LGPD. Cabe agora aguardar qual será o entendimento dos tribunais quanto a essa matéria.